Os piratas que lhe vendem música
Imagine a situação seguinte. Acabou de comprar um CD do seu grupo favorito e ao chegar ao trabalho insere-o no leitor de CD do computador para o ouvir. Passado um instante o som vibra pelos auscultadores, transmitindo-lhe a batida que lhe ritmará o trabalho.
O que há de errado neste cenário tão familiar a quem passa dias à frente de computadores? É o que iremos ver.
A industria da música - e a do áudio-visual no geral - queixa-se com insistência dos actos de pirataria de que serão vítimas. Poderíamos pensar que quem assim se queixa estaria sensibilizado para seguir um código de conduta exemplar, que fosse modelo para aqueles que tanto critica. No entanto, na suposta senda de defesa dos seus direitos, as editoras escolhem elas mesmo o caminho da violação dos direitos dos seus clientes, os compradores de CD áudio. Com efeito, sem que o utilizador se aperceba, o facto de este inserir um CD áudio no seu computador leva à instalação silenciosa de software no seu computador, vinda no CD áudio, sem que este disso se aperceba e sem dele obter prévio consentimento.
Quem é aqui o pirata? Aquele que comprou o CD ou aquele que o vendeu?
Esta situação surreal aconteceu até 2007, altura em que as editoras deixaram por completo de incluir este género de tecnologia nos CD áudio. A EMI foi a última a fazê-lo. Antes, em 2005, Mark Russinovich, um blogger ligado às tecnologias, procedeu a um estudo daquilo que a Sony BMG estava a fazer com os CD áudio. Descobriu que a Sony estava a incluir um software nos CD áudio que se instalava quando o CD era inserido no computador. Esse software tinha por função controlar as cópias dos seus CD mas era, em simultâneo uma autêntica quebra de segurança para o computador. Com efeito, o computador passava a abrir portas para cavalos de tróia. As conclusões de Russinovich, inicialmente refutadas pela Sony, acabaram por forçar as editoras a não usarem estas tecnologias. A própria Microsoft passou a incluir nas suas actualizações uma ferramenta para remover estes softwares das editoras.
Como é que funcionava este esquema de DRM?
Quando se tem o autoplay ligado, o computador ao detectar que um CD foi inserido, inpecciona o seu conteúdo e, se este tiver determinados ficheiros, executa-os. No mundo dos bem intencionados, isso serviriam para que, por exemplo, um jogo começasse em execução logo que o CD fosse inserido. No mundo real, vírus e empresas mal intencionadas aproveitam esta falha de segurança para executarem software sem que o utilizador tenha disso consciência. O autoplay tem que ser considerado uma falha de segurança e todos os possuidores de um computador deviam ter o cuidado de o desligar imeditamente.
Ora as editoras, sabendo que por padrão o Windows traz o autoplay ligado, aproveitam para fazer um truque baixo que consiste no seguinte:
- gravam o CD em multisessão;
- na primeira sessão gravam o audio;
- na segunda sessão, gravam software.
Acontece que os leitores de CD áudio não sabem o que é um CD multisessão e só vêm a primeira sessão. Já os leitores de CD nos computadores sabem o que é um CD multisessão e vêm a segunda sessão. Assim, para o leitor áudio, o CD é um CD audio e o leitor de CD toca-o. Para o computador, o CD é um CD de software e, em vez de o tocar, o computador executa o software que esteja definido para executar em autoplay. Assim, o que os editores de música faziam era fazer um CD em que a segunda sessão continha apenas software que se instala sem pedir permissão ao utilizador e que, depois de instalado, bloqueia o controla o CD. Assim, quando há funções para ler a música, este software coloca-se no meio e permite a leitura. Já quando se trata de duplicar o CD, este software coloca-se novamente no meio e rejeita o pedido.
Desligue o autoplay!
Como se resolve isto? Basta desligar a função autoplay! O que, de resto, deve ser sempre feito por questões de segurança, como já foi referido.
Para desligar o autoplay, há duas formas de o fazer:
- 1. temporariamente: neste caso, carrega-se na tecla shift antes de inserir o CD, mantendo a tecla premida até o CD estar acessível;
- permanentemente, abrindo o meu computador e depois clicar com o direito no ícone do CD, depois em propriedades e depois em autoplay. Aí para cada um dos items, selectionar "take no action" (ou o equivalente em PT).
Se se já tiver inserido alguma vez inserido um CD com estas técnicas de DRM e com o autoplay ligado, é garantido que já tenha o tal software instalado. Nesse caso, o procedimento anterior de nada servirá. Este apenas serve para novos CD. Nesse, caso, tem que se desinstalar esse software. Ver se ele está acessível no painel de controlo, onde se removem as aplicações.
Conclusão
Para proteger os seus direitos, as editoras optaram por fazer aquilo de que acusam os seus clientes: pirataria. Usaram softwares de DRM que eram um autêncio buraco de segurança. Depois de tentarem escapar às evidências, acabaram por recuar. Mas para que se deram a todo este trabalho? Bastava apenas desligar o autoplay do computador!
Leituras adicionais:
- Como fazer um CD EXTRA
- Sony BMG CD copy protection scandal
- Digital rights management (em português mas mais incompleto: Gestão de direitos digitais)
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